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Carta Asiática
Relações
Políticas e Econômicas entre o Brasil e a Coréia do Sul.
Gilmar
Masiero
1. Introdução
Desde 1945, a Península Coreana viveu intensivos conflitos
até o estabelecimento da República da Coréia,
em 1948. Os conflitos persistiram e a Guerra da Coréia
- entre o norte e o sul - teve início em 1950. Só
terminou três anos mais tarde com o estabelecimento
de uma zona desmilitarizada entre os dois países. O
presidente eleito em 1948, Syngman Rhee, proclamou-se presidente
vitalício em 1954 e foi forçado a se demitir
em 1960 devido a fortes manifestações estudantis
contra seu governo.
Durante o governo de Syngman Rhee, a exemplo do que ocorria
com a economia brasileira e latino americana em geral, a Coréia
do Sul buscou sua industrialização calcada em
substituições de importações.
Nessa época, o governo recebia grande ajuda externa
e militar, principalmente dos Estados Unidos. Algumas poucas
obras de modernização da infra-estrutura do
país foram iniciadas e as reformas educacional e agraria
implementadas.
Após um curto período de governo do Primeiro
Ministro Chang Myon (Abril/60-Maio/61) o General Park Chung
Hee, através de um golpe militar, estabelece o sistema
presidencial e governa o país durante 19 anos até
seu assassinato em 1979. Durante o governo do general Park,
a Coréia através de forte promoção
das exportações com a continuidade da política
de substituição de importações
- principalmente na indústria pesada e química
nos anos 70 - apresentou grande dinamismo econômico.
Nesse período o Produto Interno Bruto coreano cresceu
em média 9% ao ano e atingiu o recorde histórico
de 14,5% em 1973.
As duas décadas foram marcadas por grande intervenção
governamental nos negócios privados (1). Vários
planos qüinqüenais de desenvolvimento econômico
seguidos de controles financeiros e creditícios, de
controles de capital e licenças de comercialização
de tecnologia e bens e serviços nutriram o crescimento
de alguns poucos conglomerados privados - os chaebol (2) .
Nesse sentido, o governo mobilizou a poupança doméstica
e com o fim da ajuda externa passou a se utilizar de empréstimos
externos, evitando sempre que possível, o investimento
direto estrangeiro.
Pode-se dizer ainda que a Guerra no Vietnã contribuiu
para a expansão da economia coreana devido a necessidade
de suprimentos para as tropas norte-americanas em luta no
país vizinho. Na década de 70, a grande presença
dos grupos coreanos na construção de infra-estrutura
no Oriente Médio ou mesmo no mercado doméstico
com o movimento de modernização conhecido como
Saemaul Undong contribui para o crescimento dos mesmos e para
o desenvolvimento da Coréia.
Após o assassinato do general Park Chung Hee, em 1979,
por um de seus assessores imediato, o Primeiro Ministro Choi
Kyu Hah, eleito presidente por um colégio eleitoral,
governou o país por 6 meses (Nov. 79 - Maio 80). Nesse
período de contraditórias políticas e
crescentes manifestações estudantis, a Coréia
do Sul sofreu novo golpe militar e a lei marcial foi reinstituída.
Em agosto de 1980, o líder do movimento militar Chun
Doo Hwan foi eleito presidente e mais tarde, em 1988, seu
colega de exército Roh Tae Woo o substituiu no controle
do país.
Os anos 80 foram um período de gradual liberalização
econômica. Respeitáveis tecnocratas procuraram
reestruturar a economia sem a interferência dos militares
e dos grupos privados que no período anterior justificavam
suas ações nos elevados índices de crescimento
econômico. Alguma liberalização foi implementada
com tímidos resultados, em alguns casos a eliminação
de alguns controles foi postergada ou simplesmente esquecida.
Nessa década, os grupos econômicos, até
então obedientes as diretrizes governamentais, passam,
devido a seu tamanho e expansão internacional, a buscar
maior independência e autonomia frente ao governo.
No Brasil e na América Latina em geral, nesse período,
se assistiu a chamada "década perdida" e
a lenta e gradual "transição democrática"
comandada pelos militares. Na Coréia, os dois últimos
generais presidentes responderam aos choques externos e rapidamente,
sem enfrentar sérios problemas relacionados com a "crise
da dívida" recolocaram o país em sua trajetória
modernizante e desenvolvimentista. No final do governo Chun,
por exemplo, a Coréia do Sul, novamente atingia taxas
de crescimento econômico de dois dígitos. Em
1986, 87, e 88 as taxas de crescimento do PIB foram de 12,4%,
12%, e 11,5% respectivamente.
Em 1993, Kim Young Sam foi eleito presidente e governou o
país até fevereiro de 1998. A economia coreana
cresceu em média 6 % ao ano até 1997 quando
o mundo foi surpreendido por elevadas desvalorizações
cambiais em vários países asiáticos (3).
Na Coréia do Sul as desvalorizações foram
superiores a 50% e os impactos sobre as atividades empresariais
produtivas ainda estão sendo equacionados e absorvidos.
A superação da crise financeira e econômica
parece ser o principal desafio do novo presidente Kim Dae
Jung.
Nos anos noventa, quer no governo de Roh ou de Kim, a Coréia
do Sul buscou uma maior abertura econômica e reformas
na intrincada rede de relacionamentos entre o governo e os
grandes conglomerados empresariais. A atuação
do governo Kim foi pautada pelo movimento político
interno, concordante com o movimento mundial denominado segyehwa
- globalização. Este movimento na Coréia
se caracterizou pela busca de mudanças efetivas dentro
do país bem como aumentar a presença coreana
no mercado mundial.
Nos anos 80 e 90 os conglomerados coreanos expandiram sua
atuação no mercado internacional. Marcas como
Samsung, Daewoo, LG, e Hyundai tornaram-se familiares dos
consumidores de todo o mundo. O desempenho destes grupos,
fortemente alavancados financeiramente pelo governo, normalmente
se confundem com os da economia sul coreana por serem eles
os principais responsáveis pela rápida industrialização
daquele país.
O desempenho dos conglomerados e da economia sul-coreana durante
toda a sua trajetória de desenvolvimento tem atraído
a atenção de estudiosos de todas as partes do
mundo. Com a maior abertura comercial e financeira dos anos
90, tanto na Coréia quanto no Brasil o relacionamento
bilateral entre ambos ganhou maior dinamismo e importância.
Assim, o presente texto, primeiramente, resgata o histórico
dos acordos político-diplomáticos entre os dois
países e na seqüência aborda alguns números
relativos aos relacionamentos econômicos e financeiros.
Notas
(1)
PORTO DE OLIVEIRA, Amaury. Esplendor e Atribulações
do "chaebol" . Texto apresentado no Seminário
Lições da Crise Asiática: o Caso Coreano.
Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São
Paulo. Junho de 1998
(2) Chaebol é a palavra coreana que designa grandes
grupos empresariais. Em cada país os conglomerados
de empresas recebem um nome específico, assim como
possuem características distintas em cada região.
Nesse trabalho considera-se chaebol como sendo um grande grupo
privado de propriedade familiar e administrado por uma estrutura
de comando composta por membros de uma mesma família.
(3) GALL, Norman. Dinheiro, Ganância e Tecnologia. Ensaio
apresentado na conferência internacional sobre o Brasil
e a crise asiática, organizado pelo Instituto Fernando
Braudel e patrocinado pela FAAP. Edição especial
do Braudel Papers. N° 20, 1998. Sobre a crise na Coréia
do Sul entre as muitas e desencontradas opiniões e
também pelo fato de que "the crisis is still ongoing
and we do not as yet fully understand" o texto Korean
Economic Crisis: Causes and Lessons de Woo Tack Kim, apresentado
no Seminário Lições da Crise Asiática:
o Caso Coreano, é até o momento, a melhor referência
sobre o assunto
1. Relacionamento Político-Diplomático (4)
Em 1948, a República da Coréia, após
o fim do regime provisório conduzido pelas Forças
Armadas norte-americanas, desde o fim da Segunda Guerra Mundial,
foi estabelecida. O relacionamento político-diplomático
do Brasil com a Coréia do Sul teve início em
junho de 1949. O Brasil foi o oitavo país do mundo
e o segundo latino-americano (o primeiro foi o Chile) a reconhecer
oficialmente aquele país asiático.
Os motivos que levaram o Brasil a estabelecer relações
diplomáticas com a República da Coréia
podem ser percebidos no contexto da Guerra Fria que se seguiu
à Segunda Grande Guerra. O Brasil nos anos posteriores
a formação da ONU - Organizações
das Nações Unidas - desempenhava suas atividades
integrado ao bloco das nações ocidentais liderado
pelos Estados Unidos. Este alcançava, na época,
a hegemonia quase absoluta sobre todo o sistema capitalista
em confronto com
o sistema socialista da União Soviética.
Em 1950, o Brasil apoiou as decisões da ONU que condenavam
o conflito entre a parte norte e a parte sul da Coréia
estabelecendo uma linha de crédito e enviando remédios
e alimentos para a Coréia do Sul. Durante o conflito
bélico na península coreana (1950-53), os Estados
Unidos demandavam uma ação mais ativa do Brasil
solicitando o envio de tropas.
Nem o governo Dutra (1946-51) nem Vargas, que voltou ao poder
em 1951, cederam a pressão norte-americana.
Divergências ao apoio militar aos Estados Unidos na
Guerra da Coréia dominavam as discussões políticas
no Brasil dos anos cinqüenta devido a acordos militares
de assistência, além de outros de cooperação
técnica e econômica, entre o Brasil
e os Estados Unidos (5).
Durante e após o conflito bélico na Coréia,
o Brasil, a exemplo dos demais países latino-americanos,
sempre votou favoravelmente à Coréia do Sul.
O Brasil, através do relacionamento de amizade com
o governo coreano e comportamento cooperativo com os Estados
Unidos atendia os interesses deste último não
só na península coreana, onde era imperativo
impedir a expansão do comunismo, como também
na América Latina, onde era imperativo a manutenção
da paz hemisférica.
Após estabelecer relações diplomáticas
com a Coréia do Sul, em 1959, no início dos
anos 60 o embaixador brasileiro no Japão, Décio
de Moura, foi também designado para a Coréia.
Em 1965, o Brasil estabeleceu sua embaixada em Seul e em 1967
designa seu primeiro representante oficial naquele país,
o Embaixador Bartel Rosa. Outros países latino-americanos
continuaram aproveitando seus embaixadores de forma cumulativa
designando-os para Tóquio e Seul ao mesmo tempo.
A partir dos anos 60, o governo coreano passa a intensificar
sua atividade diplomática - acordos e missões
comerciais - com países considerados comercialmente
estratégicos. Em 1962, estabelece na cidade do Rio
de Janeiro, sua primeira embaixada na América Latina
e a décima terceira no mundo. Mais tarde, em 1970,
devido a maior demanda de serviços pelos imigrantes
coreanos, instala em São Paulo, o Consulado Geral.
Em janeiro de 1961 foi criada na Coréia do Sul uma
associação de emigração (6). No
mesmo ano uma missão para cuidar dos projetos de emigração
e do processo de instalação da embaixada em
solo brasileiro chegou ao Brasil. O embaixador coreano nos
Estados Unidos veio ao Brasil para a posse do Presidente Jânio
Quadros. Este se mostrava receptivo à vinda de coreanos
e, mesmo não se dispondo a subsidiá-los, estava
disposto a ceder gratuitamente terras no norte do Brasil.
O golpe militar de 1961, na Coréia, comandado pelo
general Park Chung Hee despertou o interesse de muitos sul-coreanos
pela emigração. Nesse período, como também
no período dos governos de Syngman Rhee (48-60) e Yun
Po Sun (60-61) a insatisfação do povo coreano
com suas elites era grande. Além da crescente descontinuidade
da ajuda externa norte-americana, a corrupção
política, os abusos de poder e as eleições
presidenciais pouco transparentes eram predominantes (7).
Nessa época metade do orçamento do governo dependia
da ajuda externa.
O novo governo coreano apoiou de forma irrestrita o movimento
migratório. A comissão Superior de Reconstrução
da Coréia que substituía o Congresso durante
o regime militar aprovou um projeto de lei oficializando a
emigração em grupo em 1962. O governo visava
com isto, e com mais um programa de controle da natalidade,
reduzir rapidamente o crescimento populacional na Coréia
e minimizar o impacto do baby boom do pós-guerra nas
escolas e mais tarde no mercado de trabalho. Visava também
reduzir o desemprego, adquirir moeda estrangeira e promover
laços de cooperação com países
não-comunistas.
Dessa forma, chegam ao Porto de Santos, em fevereiro de 1963,
um grupo de 103 sul-coreanos e em novembro do mesmo ano mais
um grupo de 350 pessoas. Estes grupos são assentados
nas proximidades de Guarulhos e Mogi das Cruzes, no estado
de São Paulo. No ano seguinte, outros dois grupos,
totalizando 635 sul-coreanos, chegam ao Brasil e se instalam
em São Paulo e no Rio de Janeiro. Nos anos de 1965
e 1966 mais 1065 chegam no Paraná e outros 3032, que
chegam entre os anos de 1967 e 1970, permanecem em São
Paulo.
O maior número, 4028 de imigrantes chegam ao Brasil
nos anos de 1971 e 1972 (8). Após isto, registram-se
ainda outros 752 entre 1973 e 1979 e mais 848 entre 1980 e
1985 (9). Além do Brasil, os Estados Unidos, Canadá,
Austrália e África do Sul eram as opções
dos emigrantes sul-coreanos. A preferência de destino
dos emigrantes era os Estados Unidos, porém, o sistema
de cotas estabelecido para os asiáticos em geral, dificultava
a emigração para aquele país. O Brasil,
naquela época, mais industrial e economicamente mais
desenvolvido que a Coréia do Sul, apresentava-se como
uma opção possível. O êxito da
emigração japonesa em anos anteriores, também
contribuiu para que o interesse do governo e do povo coreano
pelo Brasil fosse grande.
A imigração de sul-coreanos em grupo para o
Brasil, atendendo ou não a projetos oficiais dos respectivos
governos foi intensa até o início dos anos 70.
A partir de 1973, o governo brasileiro passa a restringir
os movimentos imigratórios e, assim, muitos sul-coreanos
passam a emigrar individualmente via Panamá para países
vizinhos como o Paraguai e a Bolívia. Posteriormente,
de forma clandestina, eles migram para o Brasil, a Argentina
ou mesmo para os Estados Unidos.
Em 1980, houve nova regulamentação da lei brasileira
de imigração e cerca de 4500 sul-coreanos encontravam-se
em São Paulo em situação irregular. Estes
sul-coreanos e outros 2500 em 1989, que ilegalmente entraram
no país, via Paraguai, foram anistiados e tiveram sua
situação regularizada. No início dos
anos 90, a embaixada da Coréia do Sul, divulga que
aproximadamente 43 mil sul-coreanos residem no Brasil. A "Revista
Veja" (10), em maio de 1998, divulga que o número
de imigrantes legais chega a 45 mil e o número de ilegais,
segundo estimativas da Polícia Federal, chega a 35
mil.
A maior parte das metas acordadas entre o Brasil e a Coréia
do Sul com respeito à emigração não
foram atingidas e a imigração clandestina, desde
a segunda metade dos anos 70, dificultou o relacionamento
entre os dois países. Entretanto, não se pode
negar que a emigração coreana em grupo para
o Brasil foi o primeiro assunto prático e específico
do relacionamento bilateral em que os dois países tinham
interesses recíprocos. A presença dos imigrantes
coreanos certamente contribuiu para o aumento das transações
entre os países, especialmente as que dizem respeito
ao comércio bilateral.
O Jornal "O Estado de São Paulo" (11) registra
esse aumento do relacionamento entre os dois países
em reportagem publicada em agosto de 1993. Segundo a reportagem,
os imigrantes coreanos são proprietários de
2500 empresas instaladas no Brasil, sendo 90% delas, em São
Paulo e alguns deles comandam hoje 110 tradings, fazendo transações
comerciais principalmente com a Coréia do Sul, Hong
Kong, Taiwan e o Japão. No total, criam, assim, cerca
de 70 mil empregos no Brasil.
A "Revista Veja", acima mencionada, reforça
ainda mais a presença dos coreanos nas atividades comerciais.
De acordo com a revista, a colônia com cerca de 80 mil
pessoas concentradas basicamente na cidade de São Paulo
tem dominado o setor de confecções, até
então explorado por árabes e judeus. Trabalhando
em pequenas empresas de estrutura familiar, os coreanos confeccionam
e comercializam 33% das roupas femininas vendidas no país.
As novas gerações de sul-coreanos brasileiros,
no entanto, participam a cada ano com maior ênfase das
profissões liberais.
Conjuntamente ao relacionamento econômico e político-diplomático
desenvolveu-se também, uma aproximação
cultural entre os dois países. Nesse sentido, após
o golpe militar de 1961, na Coréia do Sul, com o objetivo
de apoiar o aumento da emigração para o Brasil
é criada a Sociedade Cultural Brasil-Coréia.
Mais tarde, em 1963, no Brasil é fundado o Instituto
Cultural Brasil-Coréia, no Rio de Janeiro, com a finalidade
de estimular laços de amizade e intercâmbio intelectual
e artístico, além de colaborar com os respectivos
governos para o bom cumprimento dos acordos culturais.
Entre as atividades desenvolvidas pelo Instituto pode-se destacar
o estabelecimento de irmandade entre cidades, como, por exemplo,
Seul e São Paulo desde 1977, Pusan e Rio de Janeiro
desde 1985 ou mesmo Taegu e o Estado de Minas Gerais desde
1995. Destaca-se também a realização
de turnês de grupos de danças tradicionais, exibições
de fotografias, filmes, artes e visitas oficiais e não
oficiais de comissões de amizade. O Instituto incentiva
ainda o intercâmbio esportivo, principalmente do futebol
e taekondo.
Todo este relacionamento cultural foi fortalecido pela assinatura
em janeiro de 1966 de um Acordo Cultural entre os dois países
[Ministro das Relações Exteriores Juracy Magalhães
e Embaixador no Rio de Janeiro Park Tong Jin] Neste ano, com
o aumento do intercâmbio e crescente emigração
foi criado um curso de língua portuguesa na Universidade
de Hankook em Seul e bem mais tarde, no início dos
anos 90, o Departamento de Línguas Orientais da Universidade
de São Paulo passou a ministrar cursos de língua
coreana como parte de suas atividades de difusão cultural.
Antes do acordo cultural, o Brasil e a Coréia do Sul
haviam assinado somente um acordo comercial em maio de 1963
[Ministro das Relações Exteriores Hermes Lima
e Embaixador no Rio de Janeiro Park Tong Jin]. Nele os dois
países não estabeleceram nenhum relacionamento
especial, concordando somente que se esforçariam para
o incremento do comércio bilateral e que não
tratariam os produtos oriundos dos dois países de maneira
diferenciada aos oriundos de terceiros países. Esse
acordo ganha significado histórico pois, à exceção
do acordo cultural mencionado acima, os dois países
assinaram dois novos acordos somente nos anos de 1984 e 1989.
Do final dos anos 60 até a primeira metade dos anos
80, o desenvolvimento do comércio, embora lento, foi
constante e gradual. Além do crescimento das relações
comerciais, cresceram também o número de visitas
mútuas de empresários e parlamentares. Em 1978,
por exemplo, um grupo de 46 pessoas lideradas pelo deputado
Jesse Pinto Freire, visitou a Coréia do Sul. Na ocasião
foi estabelecida uma "Conferência Econômica
Brasil-Coréia do Sul" que realizou algumas conferências
para tratar de assuntos de interesse recíproco. Mais
tarde, essas atividades foram incorporadas em outras comissões
e acordos relacionadas com o assunto.
Em 1982, por ocasião da 37ª Assembléia
Geral da ONU, os ministros das relações exteriores
dos dois países se encontram em Nova York. Nesse encontro
discutem a possibilidade de aquisição e doação,
pelo governo coreano de duas propriedades rurais, "Poções"
e "Santa Cruz" ao Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária - INCRA. Em janeiro de 1984, em Brasília,
a doação é realizada através da
assinatura de acordo pelos ministros das relações
exteriores dos dois países. No final dos anos 80, com
a crescente abertura econômica brasileira o relacionamento
político-diplomático intensificou-se. Em 1989,
em Seul, foi firmada uma convenção para evitar
a dupla tributação e prevenir a evasão
fiscal em matéria de imposto sobre a renda [Embaixador
Moacyr Moreira Martins Ferreira e Ministro das Relações
Exteriores Choi Ho Choong] (12). Em setembro do mesmo ano,
em Brasília, é assinado um memorando visando
o estabelecimento de uma comissão mista para discutir
e buscar uma maior cooperação entre os dois
países nos anos 90 [Embaixador Kwon Tae Woong e Vice-ministro
das Relações Exteriores Paulo Tarso Flecha de
Lima] (13).
Desejando promover as relações bilaterais e
expandir a cooperação mútua, os dois
países assinaram o memorandum acima envolvendo um espectro
grande de setores. Segundo o memorandum, os dois países
devem aumentar os esforços para desenvolver maior cooperação
econômica, comercial, agrícola, industrial, técnica,
tecnológica e científica e cultural. Para facilitar
o alcance desse propósito os países devem estender
o necessário suporte para aumentar o contato entre
suas respectivas organizações e empresas.
Para estudar projetos e planos de cooperação,
o memorandum criou uma comissão conjunta para realizar
sessões ordinárias em Seul e Brasília
a cada dois anos de forma alternada. A comissão conjunta
que pode instituir subcomissões, deve entre outras
coisas, discutir e arquivar os resultados das discussões
dos seguintes tópicos: a) revisão dos desenvolvimentos
da cooperação mútua; b) estudo dos relatórios
das subcomissões; c) troca de informações
e d) estudo dos planos e propostas com respeito as possibilidades
de aumento da cooperação nos campos de interesse
recíproco.
No primeiro encontro em Seul, em abril de 1991, foram discutidos
em três subcomissões assuntos de interesse mútuo.
Entre eles, a título de exemplo, pode-se destacar na
área de relações econômicas e comerciais:
os esforços a serem envidados para a correção
de desequilíbrios nas balanças comerciais dos
dois países; o estabelecimento de acordos nas áreas
de serviços aéreos, investimentos e garantia
dos mesmos por empresas coreanas no Brasil; e, não
só a participação do Brasil
na Expo 93 de Taejon, como também a visita de autoridades
brasileiras, ligadas a Confederação Nacional
da Indústria,
à Coréia do Sul.
Em uma segunda subcomissão na área da ciência
e tecnologia, foram discutidos assuntos mais estritamente
relacionados ao desenvolvimento científico e tecnológico
dos dois países. Além de possível cooperação
entre o CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico e o KIST - Korean Institute for Science
and Tecnology, foram analisadas propostas de maior cooperação
nas áreas de novos materiais e materiais eletrônicos
e uma maior aproximação na pesquisa aeronáutica
e espacial. Por proposição da Fundação
Oswaldo Cruz, foi discutida também uma possível
cooperação no desenvolvimento de novas vacinas.
Uma terceira subcomissão analisou problemas relativos
a melhoria da administração consular e a possibilidade
de dispensa de vistos em passaportes diplomáticos e
de serviço.
Devido a importância dos assuntos discutidos nesta primeira
reunião, em agosto de 1991, o Ministro das Relações
Exteriores do Brasil, Francisco Rezek, à convite do
Ministro das Relações Exteriores da Coréia
Lee Sang Ock visita Seul pela primeira vez na história
do relacionamento dos dois países. Na oportunidade
da visita, foi assinado um acordo de cooperação
na área de ciência e tecnologia(14). No acordo
são estabelecidas iniciativas relativas ao intercâmbio
de informações científicas e tecnológicas,
à realização de simpósios e seminários,
bem como, o intercâmbio de cientistas e pessoal técnico.
Além disso,
o acordo estabelece uma comissão para formular, rever
e aprovar o Plano de Cooperação Científica
e Tecnológica.
No mês subsequente a visita do ministro, setembro de
1991, foi estabelecido um grupo de trabalho para discutir
os serviços aéreos entre os dois países.
Em agosto do ano seguinte, 1992, autoridades dos dois países
[Ministro das Relações Exteriores Celso Lafer
e Embaixador Han Cheol Soo] assinam em Brasília um
Acordo sobre Serviços Aéreos Entre e Além
de Seus Respectivos Territórios. Nesta ocasião,
foram também trocadas notas para a dispensa de vistos
em passaportes diplomáticos
e de serviços, assunto este previamente discutido na
Primeira Reunião da Comissão Mista Bilateral.
No acordo aéreo ficou estabelecido que, enquanto operando
dentro das rotas específicas, as linhas aéreas
designadas podem: a) voar sem aterrizar sobre o território
nacional; b) parar em território nacional para outros
propósitos que não os
de transporte de carga e passageiros; c) apanhar e descarregar
passageiros, carga e correspondência em qualquer ponto
das rotas especificadas. As rotas especificadas foram as de
qualquer ponto do Brasil para Seul e Pusam e de qualquer ponto
da República da Coréia para São Paulo
e Rio de Janeiro. As companhias designadas para operar nessas
rotas foram
a KAL - Korean Airlines pelo lado coreano e a VASP - Viação
Aérea de São Paulo, pelo lado brasileiro.
Ainda no ano de 1992, foram rubricados o Tratado de Extradição
e o Acordo para a Promoção e Proteção
Mútua de Investimentos entre o Brasil e a Coréia.
O acordo de investimentos assinado em setembro de 1995, encoraja
a criação de condições favoráveis,
para investidores de ambos os países realizarem investimentos
em seus territórios de acordo com as respectivas leis
e regulamentações. Estabelece também
que investimentos e investidores devem receber tratamento
justo e desfrutar de completa proteção e segurança.
Além disso, cada país, de acordo com sua legislação,
deve propiciar as autorizações necessárias
para que os investimentos sejam realizados e permitir contratos
de manufatura e assistência técnica, comercial,
administrativa e financeira. Deve, ainda, disponibilizar autorizações
requeridas para as atividades de consultores e especialistas
contratados pelos investidores.
No ano de 1992, foi discutido a realização de
acordos na área criminal e do turismo. O Acordo de
Cooperação no Domínio do Turismo foi
assinado em 1996. Nele, os países se comprometem a
encorajar esforços de cooperação entre
suas autoridades para a transferência de tecnologia
na área do turismo, na promoção conjunta
de publicidade e na troca de agentes e especialistas em turismo.
Se comprometem a estruturar e promover a cooperação
do setor privado dos dois países para desenvolver a
infra-estrutura de viagens e turismo, como também,
intensificar as comunicações e os transportes
entre
os dois países.
As discussões da Comissão Mista Bilateral e
a política de abertura comercial e econômica
brasileira, certamente, alavancaram o relacionamento político-diplomático
entre o Brasil e a Coréia nos anos 90. Em 1991, a exemplo
de 1949, o Brasil não deixou de apoiar o ingresso da
Coréia do Sul (juntamente com a Coréia do Norte)
na ONU e exercendo um papel de liderança nesse processo.
As conversações, desde então prosseguiram
de forma intensa. O crescente intercâmbio político
e econômico levou o presidente sul-coreano, a convite
do presidente brasileiro, a visitar o Brasil em setembro de
1996. Na oportunidade, Kim Young San, em discurso oficial,
declarou que "as trocas comerciais triplicaram nos últimos
três anos, chegando a US$ 3 bilhões somente no
ano passado. As trocas materiais e de pessoal entre nossos
dois países têm crescido continuamente desde
o estabelecimento da rota aérea em 1992 entre Seul
e São Paulo. Além disso, aproximadamente 40.000
imigrantes e numerosas empresas coreanas realizando negócios
no Brasil, jogam um importante papel na cooperação
bilateral" (15).
Na ocasião a imprensa de São Paulo divulgou
notícias contraditórias quanto ao volume de
capital a ser investido pelos sul-coreanos nos setores automotivo,
naval, siderúrgico, eletrônico e de telecomunicações.
Segundo a "Folha de São Paulo" as "cifras
citadas pelos dois países são de US$ 2.3 bilhões,
US$ 3 bilhões e US$ 5 bilhões" (16). Além
das desencontradas cifras a serem investidas até o
ano 2000, outro assunto não muito divulgado, mas bastante
discutido entre os dois presidentes, foi o regime automobilístico
brasileiro e a decisão do governo de impor cotas de
importação aos produtos têxteis coreanos.
O jornal "O Estado de São Paulo", quando
da visita de Kim Young San, informou também que, além
dos investimentos das montadoras Hyundai, LG e Daewoo na indústria
eletroeletrônica e de informática, o capital
sul-coreano deve participar da privatização
da Vale do Rio Doce. A Vale é a maior fornecedora de
minério de ferro para a maior siderúrgica da
Coréia do Sul, a Pohang Iron & Steel Co. Ltd. A
Pohang, em associação com a Vale está
investindo US$ 400 milhões na construção
de uma usina de pelotização de minério
de ferro em Vitória.
Na área econômica, discutiu-se a possibilidade
do Eximbank coreano que assinou um acordo de US$ 20 milhões
com o Bradesco e mais US$ 30 milhões com outros 4 bancos
brasileiros para crédito a importações
também financiar o gasoduto Brasil-Bolívia,
desde que a obra tenha participação de companhias
coreanas. Empresários dos dois países assinaram
um acordo de cooperação entre a Confederação
Nacional da Indústria - CNI e a The Small and Medium
Industry Promotion Corporation - SMIPC. As duas instituições
acordaram em cooperar nas áreas de transferência
de tecnologia e investimentos entre as pequenas e médias
empresas dos dois países.
Na esfera político-diplomática, autoridades
dos dois países [MRE Luiz Felipe Lampreia e MNE Gong
Ro Myung] firmaram, em Brasília em 11 de Setembro de
1996, um Memorandum de Entendimento para Consultas Políticas(17).
As partes decidiram estabelecer consultas políticas
de alto nível entre representantes dos dois países,
de forma alternada em Brasília e em Seul, com periodicidade
anual, ou com maior freqüência, caso as circunstâncias
exijam. Além dos encontros regulares, o memorandum
prevê a organização de encontros de peritos
e grupos de trabalhos especiais, para estudar questões
de interesse comum. Um desses grupos é a Comissão
Coréia-Brasil Século XXI que, desde então,
já se reuniu em três oportunidades (18).
Este quadro de crescente relacionamento, não só
político diplomático mas também econômico
e financeiro entre o Brasil e a Coréia do Sul, sofreu
grande impacto na segunda metade de 1997. Neste ano, o mundo
foi surpreendido com a "Crise Asiática".
Por diversificadas causas, diferentes países asiáticos,
como a Tailândia, a Indonésia e a Malásia
foram forçados a desvalorizar radicalmente suas moedas.
Além destes países, a Coréia do Sul,
também teve que desvalorizar o Won em mais de 50%.
Seus relacionamentos com o mercado interno, como também
com o internacional, precisaram ser reestruturados e esforços
desde então vem sendo despendidos para a superação
da crise.
Notas
(4)
Quando não especificado, todo este ítem é
desenvolvido a partir do Korean Annual, do Almanaque Abril
e de LEE, Sangki. Brasil e Coréia do Sul: aspectos
político-econômicos do relacionamento bilateral.
Dissertação de Mestrado. Brasília: UnB,
1995.
(5) Antes do final de 1950, um acordo entre o Brasil e os
Estados Unidos criou a Comissão Mista Brasil-Estados
Unidos para o Desenvolvimento Econômico. Esta comissão
desenvolve suas atividades até o final de 1953.
(6) CHOI, Keum Joa. Além do arco-iris: a imigração
coreana no Brasil. Dissertação de Mestrado.
São Paulo: USP, 1991. pp. 34-37.
(7) CLIFFORD, Mark L. Troubled Tiger: Businessmen, Bureaucrats
and Generals in South Korea. London: Sharpe, 1994. Os capítulos
3 e 6 enfatizam a corrupção existente na época.
(8) Possívelmente uma das causas do crescimento da
imigração esta associada a declaração
da lei marcial no ano de 1972 pelo general Park Chung Hee
e o estabelecimento da nova constituição denominada
de Yushin - Revitalização.
(9) CHOI, Keum Joa. Além do arco-iris: ... pp.49-85.
(10) Revista Veja. Especial: O enigma dos coreanos no Brasil.
13 de maio, 1998. Pp 54-58.
(11) O Estado de São Paulo, Economia, p.6. 09 de Agosto,
1993.
(12) DOU, terça-feira, 3 de dezembro 1991. Seção
1. p. 27570.
(13) Este e os próximos parágrafos, quando não
especificado, foram sistematizados a partir dos próprios
acordos pesquisados junto ao Consulado Geral da Coréia
em São Paulo e em entrevistas com o Cônsul Won
Chong On e o Cônsul Jun Dae Chun em Junho de 1998. Além
deles muitas informações foram disponibilizadas
por Cristina Campos, secretária-executiva do Consulado
Geral da Coréia em São Paulo.
(14) DOU. Segunda-feira, 8 fevereiro 1993 Seção
1. p.1662.
(15) Korea´s Quest for Reform and Globalization: Selected
Speches of President Kim Young San. Vol. II. Office of the
President. The Republic of Korea, 1997.
(16) Folha de São Paulo, 12 de setembro, 1996. 2. p.9.
(17) Diário Oficial Nº 182. Quarta-feira, 18 Set.
1996.
(18) Na segunda reunião em Seul em 12 de Novembro de
1997 foram discutidos entre outros os seguintes assuntos:
no campo industrial e econômico: a) trocas de informações
sobre o sistema bancário; b) indicação
de apropriadas áreas para investimentos brasileiros
na Coréia; c) indústrias tecnológicas
de informação de telecomunicações;
d) cooperação entre pequenas e médias
empresas. Na área de ciência e tecnologia: a)
padrões industriais; b) biotecnologia; c) física:
o Laboratório de Ligth Syncroton. E na área
Educacional e Cultural: a) modalidades de cooperação
e áreas prioritárias para as trocas bilaterais;
b) troca de informações sobre instituições
culturais e eventos de interesse dos dois países
3. Relacionamento Econômico-Financeiro
Nos anos 50, o intercâmbio comercial entre o Brasil
e a Coréia do Sul, a exceção da ajuda
em material e medicamentos na Guerra da Coréia, foi
praticamente inexistente. Dados da CACEX - Carteira de Comércio
Exterior do Banco do Brasil, informam que foi somente em 1958
que uma tímida exportação de café
e alguns produtos químicos, no valor de US$ 12.700,
foi efetivada. Em 1960, as exportações atingem
a cifra de US$ 800.000 e ultrapassam a marca de US$ 1 milhão
em 1962. Desde então, as exportações
são descontinuadas ou inexistentes até 1968,
quando são registrados US$ 1.3 milhões (19).
O acordo comercial assinado em 1963, parece não ter
contribuído para um maior volume de trocas comerciais
entre os dois países durante toda a década de
60.
O comércio bilateral nos anos 60, limitou-se a exportação
de açúcar, arroz, produtos farmacêuticos,
produtos têxteis e máquinas de costura do lado
brasileiro. As exportações coreanas para o Brasil,
caracterizavam-se por diferentes matérias-primas de
origem vegetal, como por exemplo a alga, por produtos químicos
orgânicos e por perucas. Muitos dos produtos importados
pelo Brasil, principalmente alimentos tradicionais da Coréia,
estão associados ao fenômeno da imigração
de sul-coreanos para o Brasil ao longo dos anos 60 e 70.
Nos anos 70, ocorre um crescimento significativo nas trocas
comerciais entre os dois países. De acordo com dados
do Korean Statistical Yearbook (20), as exportações
coreanas para o Brasil cresceram ininterruptamente na primeira
metade da década de 70 até atingir a cifra de
US$ 25 milhões. Produtos de borracha (como por exemplo,
pneus e câmaras), e ferro e aço, até então
inexistentes na pauta de exportações, foram
predominantes neste ano. A partir de então, as trocas
declinaram e se limitaram a aproximadamente US$ 5 milhões,
em média, durante a segunda metade da década.
Do lado brasileiro, as exportações foram crescentes
durante todo o período e alcançaram a cifra
de US$ 30 milhões em 1978 e mais que o dobro desse
valor no ano seguinte.
Embora o volume de trocas comerciais entre os dois países
tenha aumentado durante os anos 70, em termos relativos os
percentuais não foram superiores aos da década
anterior. Observa-se porém, que o Brasil ficou deficitário
no balanço comercial com a Coréia de 1972 a
1975. Nesse período, ou mais especificamente de 1967
a 1974 o Brasil obteve grande crescimento econômico.
O sucesso ou "milagre" econômico brasileiro
foi seguido de vários choques externos, como os do
petróleo, a redução do crescimento mundial
desde os anos 70 e o crescimento da dívida externa
acompanhada da elevação dos juros internacionais
(21) . Estes fatores, somados a outros problemas político-econômicos
internos, impediram o crescimento prolongado e descontinuaram
as importações de pneus, ferro e aço,
produtos têxteis, produtos químicos, máquinas
e metais comuns e principalmente de relógios de pulso.
No ano de 1976, somente este produto chegou a representar
67% do total das exportações coreanas para o
Brasil.
No final dos anos 70, a Coréia do Sul ampliou suas
importações do Brasil. Nos anos de 1978 e 79
novos produtos como o farelo de soja, o suco de laranja, o
ferro e aço e os semi-manufaturados de ferro fundido,
foram incorporados a pauta de importações coreana.
Dos insignificantes percentuais de produtos importados do
Brasil sobre o volume total de importações da
década de 60 (0,08 % em 1962), a Coréia do Sul
chega, ao final da década de 70, demonstrando um expressivo
crescimento (0,30 % em 1979) (22).
As relações comerciais nos anos 70, embora com
maior volume e diversificação de produtos trocados
foi muito irregular. Alguma regularidade foi conseguida na
exportação brasileira de café, algodão,
linho, hematita, máquinas e equipamentos e na parte
coreana, na exportação de tecidos de fibras
sintéticas, produtos químicos orgânicos,
ferro e aço, máquinas, equipamentos elétricos
e mecânicos e relógios. Produtos brasileiros,
como o farelo de soja, o suco de laranja e a pasta química
de madeira conseguiram regularidade na pauta de exportação
somente na virada dos anos 80.
A maioria dos produtos brasileiros exportados para a Coréia
do Sul, principalmente matérias-primas e produtos industriais
semi-manufaturados era destinada a utilização
industrial. Já, a maior parte das exportações
coreanas para o Brasil caracterizava-se por bens de consumo
como os anteriormente citados relógios de pulso, pneus
e câmaras e materiais têxteis. Esta diferenciada
pauta comercial reflete diferentes estágios de desenvolvimento
econômico dos dois países ao longo de seus processos
de industrialização. Reflete, também,
políticas comerciais que, enquanto na Coréia
do Sul privilegiam a produção, no Brasil, ao
contrário, dão prioridade ao consumo.
Nos anos 80, as exportações brasileiras para
a Coréia do Sul cresceram de forma gradual durante
toda a década, ultrapassando a 1% do total de produtos
importados pela Coréia em 1989. As importações
por sua vez, embora tenham mais que dobrado nesse ano em relação
ao ano anterior, não apresentaram regularidade e crescimento
expressivo. No final da década as importações
brasileiras em média não ultrapassaram o percentual
da década anterior e o saldo comercial foi favorável
ao Brasil ao longo de toda a década de 80.
É provável que os saldos comerciais positivos
na balança comercial tenham se repetido nos demais
países latino-americanos. Durante a "década
perdida" na América Latina, vários governos
implementaram agressivas políticas comerciais exportadoras
no sentido de gerar divisas para o pagamento de seus compromissos
com os credores internacionais. Por outro lado, devido as
crises do petróleo, a Coréia do Sul, buscou
uma maior diversificação das fontes de fornecimento
de recursos naturais. México e Equador, por exemplo,
passaram a fornecer petróleo e o Brasil ampliou o fornecimento
de recursos minerais metálicos.
A Coréia do Sul dos anos 80, no governo do general
Chun Doo Hwan, deu início a um tímido processo
de liberalização comercial e financeira. Tradicionalmente
o país tem se utilizado de maneira extensiva de regulações
e restrições comerciais, tanto quantitativas
quanto qualitativas. O regime comercial importador coreano
funcionava de forma dual: relativamente livre para os exportadores
e restritivo de importações para o consumo doméstico.
Com o novo governo, alguma liberalização foi
implementada, principalmente no que diz respeito a proteção
dos monopólios e oligopólios. A lei Comercial
e de Regulação dos Monopólios foi instituída
em 1981 (23).
Ferro e aço, celulose, álcool etílico,
farelo de soja, açúcar e produtos químicos
orgânicos foram os principais produtos exportados para
a Coréia ao longo dos anos 80. Ferro e aço e
o mineral hematita foram responsáveis por mais de 50%
das exportações ao longo de toda a década.
Nos anos de 1986 a 1988 esse percentual foi superior a 75%.
Nesses anos a Coréia do Sul apresentou grande crescimento
econômico chegando a 12,4 %, 12.0 % e 11,5 % de expansão
de seu PIB. Esse elevado crescimento econômico contribuiu
para consolidar a Coréia do Sul como sendo o terceiro
maior parceiro comercial do Brasil, na Ásia. Japão
e China foram os dois maiores.
O Japão tem sido o principal parceiro comercial do
Brasil na Ásia. Em média, durante a década
de 80, 5 % das importações brasileiras eram
provenientes do Japão, 2 % da China e 0,06 % da Coréia.
Já, as exportações em média foram
aproximadamente de 6%, 1,5%, e 0,60% respectivamente (24).
As exportações brasileiras foram predominantemente
de produtos minerais e agrícolas enquanto que as importações,
na quase sua totalidade, de produtos industrializados.
A partir de 1990, a Coréia do Sul ultrapassa a China
e torna-se o segundo maior parceiro comercial brasileiro na
Ásia. As importações e exportações
brasileiras crescem não só em volume como também
em termos relativos em relação ao principal
parceiro comercial na Ásia, o Japão. As exportações
crescem de 1991 a 1996 em 25% e as importações
em 800%. Pela segunda vez na história do relacionamento
comercial entre o Brasil e a Coréia do Sul, desde 1995,
registram-se déficits na balança comercial brasileira
nas trocas com a Coréia.
Foram vários os fatores que contribuíram para
a expansão do relacionamento comercial entre os dois
países. Em 1990, por exemplo, o governo Collor reduz
de forma unilateral as tarifas alfandegárias como uma
das medidas de seu plano de reforma econômica. Os vários
acordos de cooperação assinados no final dos
anos 80 e início dos anos 90 também auxiliaram
a dinamizar o comércio. Além deles, é
na década de 90 que os investimentos diretos sul-coreanos,
quer na formação de joint-ventures com empresas
brasileiras, na expansão ou criação de
escritórios para prospeção de oportunidades
comerciais ou ainda no estabelecimento de unidades industriais
tem início.
No que diz respeito aos produtos exportados não se
registram grandes diferenças entre os anos 80 e 90.
Observa-se porém que a hematita que chegou a representar
mais que 50% das exportações no início
dos anos 80, passou a representar em média 25% das
mesmas nos anos 90. Ferro e aço desde 1986 representaram
aproximadamente 45% e produtos agrícolas como o café
cru, o suco de laranja concentrado e a soja, mantiveram sua
participação em torno de 15% (25).
Máquinas, instrumentos eletroeletrônicos e mecânicos,
continuaram, nos anos 90, a exemplo dos 80, a ocupar em média
65% da pauta de importações brasileiras da Coréia
do Sul. Relatórios internos da Kotra informam que aproximadamente
50% deste grupo é composto de aparelhos eletroeletrônicos
para consumo doméstico. Os outros 50% são compostos
de equipamentos de uso industrial e peças e componentes
com participação de 20% e 30% respectivamente.
Outro item que começa a ganhar importância na
pauta de importações da Coréia do Sul
nos anos 90 é o de material de transporte. Veículos
automotores começaram a ser importados em 1987 e ainda
timidamente em 1991. Em 1992 a Hyundai Motors Co Ltd., a Kia
Motors Corp. e a Ssanyoung Motors. Co Ltd. começam
a comercializar seus produtos no mercado brasileiro. Asia
Motors Co Ltd. e Daewoo Motors Co Ltd. iniciam a comercialização
de peças e componentes e veículos automotores
em 1994. Em 1993, o item material de transporte já
alcançava 10% das importações totais
do Brasil da Coréia.
Desde 1993, as importações iniciaram um crescimento
vigoroso, crescendo aproximadamente 900% entre 1992 e 1995.
Por duas décadas, desde o início dos anos 70
a balança comercial brasileira em relação
a Coréia foi superavitária. Em 1996, as importações
totalizaram US$ 1,2 bilhão e o déficit comercial
foi da ordem de US$ 317 milhões. Nesse ano, a Coréia
do Sul, como oitavo mercado exportador brasileiro respondia
por 1,8% das vendas externas que correspondiam a US$ 838 milhões.
No ano seguinte, de acordo com dados da SECEX - Secretária
de Comércio Exterior, a Coréia foi o 9°
(participação de 2,2%) parceiro comercial do
Brasil no que diz respeito as importações e
o 18° (participação de 1,4%) receptor de
produtos exportados. Do lado das importações
Estados Unidos, Argentina e Alemanha e das exportações,
Estados Unidos, Argentina e Holanda (porto de entrada de mercadorias
para o demais países da Comunidade Européia)
são pela ordem os três principais parceiros comerciais
brasileiros.
Do lado coreano o dinamismo comercial dos anos 90 e das décadas
anteriores tem sido incentivado pela Kotra- Korea Trade Promotion
Cooperation desde 1962. A Kotra, órgão público
de pesquisa e assessoria do governo coreano na área
de comércio internacional tem como objetivo promover
o comércio exterior e a cooperação econômica
entre governos e empresas. Iniciou seus trabalhos no Brasil
em 1969 e desde 1973 possui um escritório em São
Paulo para coordenar e promover esforços de aproximação
e intercâmbio comercial e de investimentos entre a Coréia
do Sul e o Brasil.
A Kotra tem incentivado o intercâmbio comercial da Coréia
do Sul não só com o Brasil mas também
com todos os demais países latino-americanos. O grau
de importância do Brasil nas relações
comerciais e sua liderança na América Latina,
foram fatores determinantes para que o governo coreano resolvesse
criar um escritório regional para a América
Latina da Kotra. Assim, todos os escritórios comerciais
latino-americanos, incluindo o de São Paulo, estão
subordinados ao escritório central de São Paulo.
Esses escritórios incentivaram o dinamismo comercial
na região que cresceu lenta e gradualmente até
1990. Desde então ganhou forte dinamismo chegando a
triplicar o montante monetário das trocas entre 90
e 95. Até 1990 pode-se dizer que similares estágios
de desenvolvimento com pouca complementaridade, e diferentes
políticas industriais e comerciais - substituidora
de importações versus orientada para a exportação
- dificultaram um maior intercâmbio comercial. Instabilidade
econômica e restrições ao comércio
e investimentos externos também contribuíram
para o reduzido intercâmbio comercial e de investimentos.
Nos anos 90, o grande crescimento das trocas comerciais pode
ser explicado pela redução das taxas e barreiras
não-tarifárias, pelo aumento da demanda devido
a relativa valorização das moedas latino-americanas
em relação ao dólar e pela maior liberalização
dos regimes comerciais e de investimentos em praticamente
todos os países da América Latina. Do lado coreano,
além da forte apreciação do Won, produtos
eletrônicos, têxteis, automotivos e aço,
fundamentalmente através da produção
em grande escala obtiveram vantagens competitivas e foram
largamente exportados para todo o mundo.
Muitas destas exportações foram acompanhadas
pelos investimentos diretos das empresas coreanas nos mercados
latino-americanos. Os investimentos que em 1980 eram de somente
US$ 4,6 milhões chegam ao montante de US$ 337 milhões
em 1995 (26). Ainda segundo dados da mesma fonte, embora os
investimentos sul coreanos tenham sido relativamente superiores
nas demais regiões geográficas do mundo, como
também nos demais países latino-americanos como
por exemplo, Panamá, México, Argentina, e Chile,
chegaram no Brasil, em 1996, ao montante de US$ 63 milhões.
Os investimentos e reinvestimentos coreanos no Brasil direcionados
para a indústria de transformação - material
elétrico, eletrônico, comunicação,
químico e de serviços - consultoria e administração
de bens, foram da ordem de US$ 1,159 milhão nos anos
de 1991 a 1993. Esse valor foi de US$ 3,16 milhões
em 1994 e em 1995 atingiu US$ 4,38 milhões (27).
De acordo com o Censo de Capitais do Banco Central do Brasil
(28) o estoque de capital coreano no Brasil em 1995 era de
US$ 3,8 milhões. Os fluxos de investimentos foram crescentes
nos anos subsequentes na ordem de US$ 63,3 milhões
em 1996 e US$ 91,3 milhões em 1997. O relatório
observa que os investimentos estrangeiros diretos realizados
nos últimos dois anos por vários países
como Portugal, Espanha e Coréia do Sul, superaram amplamente
o estoque existente em 1995. Ressalta também que, no
caso da Coréia do Sul, o estoque de investimentos existentes
era praticamente nulo.
Esses investimentos, embora pouco expressivos se considerados
o estoque total de investimentos diretos estrangeiros em 1995
de US$ 42.530 bilhões ou o fluxo de US$ 7.665 bilhões
em 1996 e US$ 15.311 bilhões em 1997 tem contribuído
para a expansão da indústria brasileira. Os
setores receptores desses investimentos, o automobilístico,
o eletroeletrônico e o de informática consolidam
o processo de inserção das empresas coreanas
no mercado brasileiro. Esse processo, via de regra, teve inicio
com a exportação de produtos coreanos para o
Brasil, a abertura de escritórios comerciais, o desenvolvimento
de canais de distribuição e redes de assistência
técnica e finalmente a produção e montagem
local.
Notas
(19)
Banco do Brasil, Intercâmbio comercial: 1953-76. vol.1
Rio de Janeiro: Cacex, 1977
(20) Dados sistematizados e apresentados por Sangki Lee em
Brasil e Coréia do Sul: Aspectos Político-Econômicos
do Relacionamento Bilateral. Dissertação de
Mestrado. Universidade de Brasília, 1995. Tabela 3.4.
p.78..
(21) NEMBHARD, Jessica Gordon. Capital Control, Financial
Regulation, and Industrial Policy in South Korea and Brazil.
London: Praeger, 1996. p. 125.
(22) Valores calculados a partir de dados do Korean Statistical
Yearbook apresentados por Lee.
(23) NEMBHARD, Jessica Gordon. Capital Control, Financial
Regulation, and Industrial Policy in South Korea and Brazil.
London: Praeger, 1996. p.82 .
(24) . LEE, Tabela 3.11 p. 92
(25) Os números deste e do paragráfo seguinte
foram disponibilizados por Marcos Ribeiros da Kotra em entrevista
realizada em Junho de 98.
(26) TAIK. Hwan Jyoung. Korean Investments in Latin America.
Texto apresentado na Conferência Regional Integration
in the Americas and the Pacific Rim. San Diego: University
of California, March 1997. http://orpheus. ucsd.edu/las/prrptk.htm.
(27) Banco Central do Brasil. Dados fornecidos pelo FIRCE/DVAP
em 08/05/98..
(28) . http://www.bcb.gov.br/htms/censo/evolução.htm
4. Considerações Finais
Após quatro décadas de dinamismo econômico,
crescimento sustentado e expansão do comércio
internacional, a economia coreana passou a enfrentar uma crise
severa a partir de outubro de 1997. De uma crise regional,
asiática, a mesma repercutiu em todos os mercados internacionais
e hoje continua a preocupar empresas e governos, quer de países
centrais, quer emergentes. Sob a liderança de seu novo
presidente Kim Dae-jung, em 1998, a Coréia tem demonstrado
grande unidade e determinação para superar as
dificuldades e retomar sua trajetória de desenvolvimento.
A nova administração do país acelerou
as reformas em curso e outras demandadas pelos organismos
multilaterais para restabelecer a confiança interna
e externa visando a atração de maiores volumes
de capital estrangeiro.
Entre as muitas medidas tomadas destacam-se: a total liberalização
dos investimentos estrangeiros que podem adquirir o controle
total das empresas domésticas; a criação
de um sistema de suporte aos investidores que disponibiliza
o encaminhamento e a aprovação, de uma só
vez, de todos os procedimentos necessários para se
operar uma empresa no país; o estabelecimento de um
Fundo de Promoção de Investimentos e, entre
outras medidas institucionais criou zonas especiais de investimentos.
Algumas dessas medidas se assemelham as tomadas por vários
governos latino-americanos, especialmente, o brasileiro, quando
da criação do regime automotivo para a região
sul e nordeste (29).
O período de redução ou isenção
de taxas e impostos para os investidores estrangeiros foi
estendido de 8 para 10 anos (100% de isenção
para os 7 primeiros lucrativos anos e 50% para os próximos
3), podendo alcançar 15 anos caso os governos locais
o desejarem. O período de utilização
gratuita de suas terras, não só nas zonas de
investimentos estrangeiros mas também, nos demais parques
industriais foi ampliado de 20 para 50 anos, podendo este
prazo ser estendido para mais 50 anos. Subsídios governamentais
e suporte para a capacitação da mão-de-obra
estão sendo disponibilizados de acordo com o volume
de empregos criados.
Os esforços governamentais para a superação
da crise e a retomada do processo de desenvolvimento econômico
podem ser vistos, também, na atuação
de sua principal agência de promoção de
comércio e investimentos, a KOTRA. Sua rede de 115
escritórios espalhados por 79 países em 1997,
será ampliada para 172 escritórios operando
em 101 países até o ano 2000. Informações
recentes, coletadas em entrevista com a diretoria da agência
de São Paulo, reforçam o esforço de ampliação
das trocas comerciais coreanas. Enquanto de janeiro a julho
de 1997, a agência organizou 60 missões comerciais
para visitar o Brasil, no mesmo período de 1998, mais
de 90 delas visitaram o país.
Para assistir o governo e as companhias coreanas na formulação
de efetivos planos de inserção em diferentes
mercados domésticos, a KOTRA estabeleceu estratégias
de longo prazo considerando diversas características
e classes de regiões. Países como China, Índia
e Rússia foram definidos como novos grandes mercados
emergentes, enquanto Estados Unidos, Japão e União
Européia, como mercados maduros. Para cada mercado
foram desenvolvidas estratégias de penetração
em cooperação com cada escritório local
no sentido de apoiar as empresas coreanas em suas estratégias
de inserção nesses mercados. Normalmente, a
agência estuda possibilidades de estabelecimento de
infra-estrutura - complexos industriais e centros de distribuição,
para facilitar a entrada ou, simplesmente, uma maior presença
de empresas e produtos coreanos em mercados selecionados.
Os diversificados grupos, dependendo de seu porte e presença
nos demais mercados do mundo possuem diferentes estratégias
e interesses nos mercados latino americanos e brasileiro.
Com a crise coreana recente, vários mercados asiáticos
tradicionais foram perdidos e o interesse por uma maior presença
comercial e industrial nos mercados sul-americanos aumentou.
Após o impacto inicial da falta de liquidez e de reestruturações
ainda em curso em alguns grandes conglomerados, os mesmos
querem ampliar sua presença nos mercados latinos. Nesta
direção, o presidente da Hyundai, foi taxativo,
quando afirma que seu grupo é muito maior que uma simples
crise financeira e que sua empresa busca realizar projetos
de infra-estrutura de grandes dimensões.
Empresas de engenharia e construção deste ou
daquele grande grupo sul-coreano, como o Hyundai ou o Sankyong,
aumentaram seu interesse pelo mercado brasileiro no que diz
respeito a construção de obras de infra-estrutura.
Desde a formulação e divulgação
dos vários projetos do "Brasil em Ação,"
pelo governo brasileiro, estas empresas tem buscado ampliar
sua atuação na implementação destes
projetos, quer como executores diretos, quer em parcerias
com empresas brasileiras ou, simplesmente, como fornecedores
de equipamentos e materiais.
A atuação destas empresas no mercado brasileiro,
com contratos da ordem de US$ 200 milhões com a Petrobrás,
por exemplo, pode ser considerada tímida quando contrastado
com contratos da ordem de US$ 25 bilhões com a Pemex
mexicana. Não só o maior porte, neste caso,
da empresa mexicana, mas também, incentivos especiais
para as empresas se instalarem nas zonas de processamento
de exportações, nas maquiladoras, tem direcionado
os investimentos sul-coreanos na América Latina. Até
os anos noventa, os investimentos eram voltados para a extração
e exportação de matérias-primas e, desde
então, o foco tem sido redirecionado para a instalação
de plantas industriais em zonas francas. Isto vem acontecendo
para as empresas não só evitarem barreiras à
entrada nos mercados emergentes mas também atuar em
escala global com produção local.
A busca pelos incentivos fiscais e outros benefícios,
oferecidos pelos governos de países considerados emergentes
parece ser fator determinante na instalação
de novas plantas coreanas em solo latino-americano ou brasileiro.
Com o objetivo de maior penetração de seus produtos
no mercado norte-americano a presença do complexo industrial
do Grupo Samsung na zona especial de exportação
de Tijuana, no México, é uma evidência
indiscutível. Suas instalações na Zona
Franca de Manaus, no Brasil também seguem a mesma orientação.
Seus atuais planos de expansão no mercado argentino
também levam em conta a existência de pesados
incentivos governamentais. A Hyundai Motors do Brasil, também
decidiu investir na construção de sua fábrica
na Bahia devido a fortes incentivos fiscais contemplados no
regime automotivo brasileiro.
Os Grupos Daewoo e LG priorizaram instalar suas fábricas
próximo do maior mercado consumidor da América
Latina, o Estado de São Paulo. As estratégias
de localização e comercialização
dos bens e serviços das empresas coreanas operando
no Brasil, seguem as diretrizes da corporação
e, em muitas delas, os impactos da crise financeira levaram
a suspensão de vários planos e projetos de implementação
de novas fábricas. Praticamente todas as empresas suspenderam
temporariamente ou redirecionaram seus recursos para diferentes
áreas de atividade ou comercialização
de diferentes linhas de produtos. Algumas delas, visando reduzir
custos, como a Kolon, a Semo, a Seungwo e a Ssangyong deixaram
de operar no país.
Mais que a proximidade com o mercado consumidor ou a existência
deste ou daquele incentivo governamental, a situação
econômica e financeira de todo o grupo, e não
desta ou daquela empresa pertencente ao mesmo é determinante
para a sua maior ou menor presença no Brasil. Esta
presença tem também crescido, desde os anos
noventa, com a maior liberalização dos mercado
brasileiro e com a criação do Mercosul.
As perspectivas de maior estabilidade política e econômica
no cone sul associadas a forte movimento político em
busca da globalização, desencadeado pela presidente
Kim Young Sam desde sua participação em novembro
de 1994, em Bogor na Indonésia na segunda reunião
de cúpula da APEC - Ásia Pacific Economic Cooperation
levaram as empresas coreanas a se instalarem nesses mercados
ou ampliarem sua presença comercial via maior intercâmbio
exportador e importador.
A desenfreada busca pela globalização das empresas
coreanas certamente é uma das principais variáveis
explicativas da recente crise financeira que temporariamente
reduziu o dinamismo econômico da Coréia do Sul.
As grandes empresas coreanas, ao longo de sua trajetória
de crescimento, sempre atenderam os apelos e as diretrizes
do governo. Recebiam em troca toda forma de subsídios
creditícios e proteção do mercado doméstico.
Quando surgiam dificuldades financeiras o governo sempre foi
o emprestador de última instância. Na recente
crise, porém, elevados compromissos de curto prazo
não puderam ser cumpridos e o governo já não
queria, e não podia, mais implementar velhas políticas
intervencionistas. Para ele, a Coréia precisa se adequar
ao fenômeno da globalização.
Na literatura administrativa, o termo globalização
é utilizado para descrever a emergência de integrados
sistemas de produção e comercialização
nos últimos 15 anos. Esses sistemas procuram obter
vantagens da nova divisão do trabalho advinda do fim
da Guerra Fria e dos progressos da indústria das telecomunicações,
principalmente dos associados ao processamento eletrônico
de dados e à utilização intensiva da
microeletrônica. Globalização é
também descrita como sendo a emergência de um
mercado global sem as tradicionais fronteiras nacionais.
Independente do uso descritivo do termo globalização
pela literatura e pelos executivos vinculados às grandes
corporações, o fenômeno é real
e os governos dos diferentes países precisam ajustar
suas políticas e instituições para enfrentar
os desafios e explorar as oportunidades do acelerado processo
de mudanças que o fenômeno vem ocasionando. O
processo ganhou momento com o fim dos fracos acordos multilaterais
no âmbito do GATT e a conseqüente criação
de um sistema mais forte e complexo de regulação
do comércio internacional centrado na OMC.
Este comércio é fundamentalmente realizado pelas
grandes empresas transnacionais, como é o caso dos
grandes conglomerados sul-coreanos, que instalam suas fábricas
e escritórios em todas as partes do mundo. O fluxo
de comércio e investimentos das empresas coreanas e
brasileiras aumentou sensivelmente nos anos 90. A crise financeira
asiática e a brasileira no início de 1999 afetou
negativamente este fluxo, mas é de se esperar, que
a dinâmica do comércio e investimentos entre
os dois países, retome sua tendência de crescimento
acelerado em curto espaço de tempo.
Estudar o relacionamento do Brasil com os demais países
asiáticos, onde, mesmo após a crise asiática,
concentra-se o maior dinamismo econômico mundial, é
imperativo. É provável que o resultado de todos
os estudos, como este realizado com relação
a Coréia do Sul, indique que para uma maior integração
do país nos mercados mundiais, o Brasil deva desenvolver
seus próprios grandes grupos privados e dinamizar suas
sempre inconstantes políticas governamentais como também
suas lentas e pesadas estruturas burocráticas
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